13 julho 2003

Cronica-Verdade
Esse texto não é meu mas bem que poderia ser...

Pensamentos rebeldes
Por Ana Kessler


São 7h.
O despertador canta de galo e eu não tenho forças nem para atirá-lo contra
a parede. Estou TÃO acabada, não queria ter que trabalhar hoje.
Quero ficar em casa, cozinhando, ouvindo música, cantarolando, até. Se
tivesse filhos, gastaria a manhã brincando com eles . Se tivesse cachorro,
passeando pelas redondezas. Aquário? Olhando os peixinhos nadarem. Espaço?
Fazendo alongamento. Leite condensado? Brigadeiro.
Tudo menos sair da cama, engatar uma primeira e colocar o cérebro pra
funcionar.
Gostaria de saber quem foi a mentecapta, a matriz das feministas que teve a
infeliz idéia de reivindicar direitos à mulher e por quê ela fez isso
conosco, que nascemos depois dela.
Estava tudo tão bom no tempo das nossas avós, elas passavam o dia a bordar,
a trocar receitas com as amigas, ensinando-se mutuamente segredos de molhos
e temperos, de remédios caseiros, lendo bons livros das bibliotecas dos
maridos, decorando a casa, podando árvores, plantando flores, colhendo
legumes das hortas, educando crianças, freqüentando saraus, a vida era um
grande curso de artesanato, medicina alternativa e culinária.
Aí vem uma "fulaninha" qualquer que não gostava de sutiã tampouco de
espartilho, e contamina várias outras rebeldes inconseqüentes com idéias
mirabolantes sobre "vamos conquistar o nosso espaço".
Que espaço, minha filha? Você já tinha a casa inteira, o bairro todo, o
mundo aos seus pés.
Detinha o domínio completo sobre os homens, eles dependiam de você para
comer, vestir, e se exibir para os amigos, que raio de direitos requerer?
Agora eles estão aí, todos confusos, não sabem mais que papéis desempenhar
na sociedade, fugindo de nós como o diabo da cruz. Essa brincadeira de
vocês acabou é nos enchendo de deveres, isso sim.
Antigamente, os casamentos duravam para sempre, tripla jornada era coisa do
Bernard do vôlei - e olhe lá, porque naquela época não existia Bernard e,
se duvidar, nem vôlei.

Por quê, me digam por quê um sexo que tinha tudo do bom e do melhor, que só
precisava ser frágil, foi se meter a competir com o macharedo? Olha o
tamanho do bíceps deles, e olha o tamanho do nosso.
Tava na cara que isso não ia dar certo.
Não agüento mais ser obrigada ao ritual diário de fazer escova, chapinha,
maquiar, passar hidratantes, escolher que roupa vestir, que sapatos,
acessórios, que perfume combina com o meu humor, nem de ter que sair
correndo, ficar engarrafada, correr risco de ser assaltada, de morrer
atropelada, passar o dia ereta na frente do computador, com o telefone no
ouvido, resolvendo problemas.
Somos fiscalizadas e cobradas por nós mesmas a estar sempre em forma, sem
estrias, depiladas, sorridentes, cheirosas, unhas feitas, sem falar no
currículo impecável, recheado de mestrados, doutorados, e especializações.
Viramos super mulheres, continuamos a ganhar menos do que eles.
Não era muito melhor ter ficado fazendo tricô na cadeira de balanço?
Chega, eu quero alguém que pague as minhas contas, abra a porta para eu
passar, puxe a cadeira para eu sentar, me mande flores com cartões cheios
de poesia, faça serenatas na minha janela - ai, meu Deus, 7h30, tenho que
levantar!
E tem mais, que chegue do trabalho, sente no sofá, coloque os pés pra cima
e diga "meu bem, me traz uma dose de whisky, por favor?", descobri que
nasci pra servir.
Cês pensam que eu tô ironizando? Tô falando sério! Estou abdicando do meu
posto de mulher moderna... Troco pelo de Amélia. Alguém se habilita?

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